POR ROGÉRIO GALINDO PARA O PLURAL
Difícil imaginar alguém mais certinho do que Flávio Arns. Senador pela Rede, o paranaense é conhecido por uma família de católicos dedicados aos direitos humanos, como o cardeal dom Paulo Evaristo Arns e a doutora Zilda Arns, fundadora da Pastoral da Criança. Para muitos, talvez seja estranho vê-lo associado a um projeto que libera produtos derivados da planta da maconha.
Mas a apresentação do projeto, que começou a tramitar nos últimos dias em Brasília graças ao senador, faz todo o sentido: Flávio Arns sempre ligou sua atividade ao tratamento de pessoas com doenças graves e deficiências. E o canabidiol, um dos derivados da cannabis, tem se mostrado imbatível na redução de feitos para algumas doenças.
“Tem crianças que têm 60 ou 70 convulsões por dia, e que com o canabidiol passam a ter duas, três. No caso do autismo, os estudos verificam mudanças importantes de comportamento”, diz o senador, que não parece preocupado com possíveis preconceitos sobre o tema. “Só deixo sempre claro que se trata da cannabis medicinal, que não tem nada a ver com o uso recreativo da maconha”, afirma.
Arns diz que o preconceito em relação à planta diminuiu muito e acredita que há clima “total” para aprovação em plenário. Já ganhou uma primeira aliada. A senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP), tetraplégica, pediu para relatar o projeto. Ela mesma conseguiu na Justiça o direito de usar o canabidiol para aliviar dores causadas por seus problemas físicos, e é uma defensora da aprovação da proposta.
Pelo projeto de Arns, fica liberado o plantio da planta da maconha apenas por empresas registradas no governo. A plantação por pessoas físicas continua proibida. O controle seria total, diz ele, para impedir o uso fora da medicina. “Eu jamais aprovaria um projeto que tivesse a ver com o uso recreativo da droga”, afirma.
Segundo ele, o importante é essa diferença. “É como a dinamite, que tem sua importância. Mas se alguém rouba a dinamite para explodir caixa eletrônico, o que você faz? Põe na cadeia. A mesma coisa vai valer para a cannabis”, diz.
Hoje, tem sido relativamente comum que a Justiça libere pacientes de algumas doenças para importar o medicamento. Em alguns casos, devido ao alto custo do remédio, permite-se inclusive que o paciente faça um plantio caseiro da cannabis, mas o senador acha que, neste caso, não há controle. “É preciso baratear o preço para quem precisa, garantir o acesso, mas manter isso sob controle”, afirma.
Arns diz que caso o projeto seja aprovado, uma possível estratégia para que o presidente Jair Bolsonaro (PSL), reconhecidamente um conservador nesses temas, não vete a ideia, será falar com a primeira-dama, Michelle. “Ela tem uma sensibilidade para esses temas, pode ser um canal importante de comunicação”, afirma.
Foto: Gluten Free Brasil