O governo do presidente Jair Bolsonaro vive seu pior, embora ainda ostente uma legião de fiéis seguidores. Mas não por força das constantes agressões que impõe – com sua narrativa preconceituosa, rasa e fascista – a grupos como as mulheres, a comunidade LGBT, os negros, os índios e todos os seus opositores. Em uma Nação construída sobre bases profundamente escravocratas e autoritárias, como o Brasil, atos de extrema violência contra os direitos humanos não são suficientes para derrubar um governo.
A fragilidade política do presidente reside em dois campos: o político e o econômico. No político, deve-se à sua relação conturbada com o Congresso Nacional. A despeito disso, mesmo pertencendo a um partido que não foi sequer legalizado e reconhecido pela Justiça Eleitoral, Bolsonaro conseguiu aprovar as reformas que desejava, ainda que apenas por mérito do presidente da Câmara Federal, Rodrigo Maia (DEM/RJ), na mobilização do “centrão” e dos grupos de centro-direita do Congresso Nacional alinhados com a agenda econômica adotada pelo Governo Federal.
O ponto mais frágil do governo, porém, é mesmo a Economia. A crise enfrentada pelo ocupante do Palácio do Planalto reside na percepção, cada vez mais generalizada, de que Bolsonaro é absolutamente incapaz de tirar o Brasil do atoleiro econômico em que se meteu a partir do governo da ex-presidente Dilma Rousseff. Mas não é a insatisfação popular com os rumos da economia que mais deveria preocupar o ocupante do palácio do Planalto.
A avaliação negativa de segmento expressivo das elites econômica e empresarial brasileira sobre o Governo Federal é bem mais grave, considerando-se o peso da categoria e o poder que exerce, na manutenção ou na derrubada de governos.
É verdade que grande parte do empresariado apoiou a candidatura de Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2018, na esperança de que o ex-capitão do Exército cumprisse o receituário neoliberal prometido durante sua campanha à Presidência no campo econômico: as reformas administrativa (com o enxugamento da máquina e das despesas públicas) e trabalhista (com a redução de direitos dos trabalhadores), a diminuição da carga tributária e das taxas de juros, a concessão de incentivos fiscais, o controle da inflação e o estímulo às exportações.
A promessa foi cumprida pela metade pelo representante do setor no Governo Federal, o ministro da Economia, Paulo Guedes. A reforma trabalhista saiu, o governo enxugou as despesas do Estado, os juros caíram, o controle da inflação foi mantido e a reforma tributária sinaliza para a redução dos impostos aos empresários.
O problema é que grande parte dos executivos quer mais que isso. Não quer só reduzir direitos dos trabalhadores, mas – acima de tudo – faturar alto, como fez, ironicamente, nos anos áureos dos dois governos de Luiz Inácio Lula da Silva. Neste período, a alta valorização das commodities aumentou o lucro dos exportadores de matérias-primas e o crescimento da massa salarial dos trabalhadores proporcionou lucros significativos aos empresários do comércio, indústria e serviços.
Não é o que ocorre, agora. De um lado, a recessão econômica gerou desemprego (ainda elevado, na faixa dos 11%), perda de poder aquisitivo dos trabalhadores e, como consequência disso, redução das vendas em vários setores, confirmada no Natal magro que tivemos no ano passado.
Basta observar a quantidade de empresas que fecharam suas portas tanto nas pequenas quanto nas grandes cidades – 316.680 apenas nos últimos quatro anos, segundo dados do levantamento Demografia das Empresas e Empreendedorismo 2017, divulgados em outubro de 2019 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Isto não é culpa apenas do governo Bolsonaro, mas sua decisão de aprofundar políticas recessivas adotadas sem sucesso pelos seus dois antecessores descontenta setores expressivos do mercado.
De outro lado, a desastrosa política externa do governo escancarou as portas do País às empresas estrangeiras, prejudicando a indústria e o comércio nacionais. Não tanto por culpa de Guedes, aliás, embora o ministro da Economia seja dotado de uma metralhadora verbal poderosa no quesito besteirol.
O maior problema reside mesmo no próprio presidente da República, que conduz o governo com postura de candidato permanente, com um olho em 2018 e outro em 2022, sem planejamento estratégico e nem com a adoção de políticas públicas claras de longo prazo capazes de resolver os impasses da nossa frágil economia.
Não há economia que resista a este cenário. Nem presidente que sobreviva a um quadro de insatisfação e de enfrentamento com os detentores do capital. Só o tempo dirá se e por quanto tempo Bolsonaro resistirá a estas pressões.
Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil